Crônicas da vida urbana
Por Crônicas da vida urbana -
Incêndios: infame inferno
No Japão do período Tokugawa – quando, por dois séculos e meio, o país se fechou às influências externas -um dos piores crimes que alguém poderia cometer, era começar um incêndio. Muito apropriadamente, a pena era o incendiário ser queimado vivo. O rigor é compreensível: nas cidades de madeira e papel, um incêndio significava uma mortandade. Acresce ainda um respeito quase místico dos japoneses pela natureza e pela paisagem.
Quando vejo os incêndios que estão ajudando a torrar o planeta, filmados do alto, penso no que acontece ao nível do chão: milhões de vidas, vegetais e animais, carbonizadas com um máximo de crueldade, sem contar os prejuízos à nossa já combalida atmosfera e os efeitos colaterais. Aí estão os gafanhotos, sendo que a maior probabilidade é terem fugido dos incêndios amazônicos, ou de algum desequilíbrio ambiental causado por eles. Uma preciosidade como oxigênio é queimado, a água cada vez mais difícil é desperdiçada, trabalho humano que poderia ter melhor uso é investido em neutralizar a irresponsabilidade de alguém.
Todo incêndio é criminoso e alguém tem que ser punido: é o tipo da ação que, entre quem joga uma bagana em lugar impróprio e quem faz uma queimada para lavoura, sempre tem irresponsabilidade humana por trás. Quem já viu uma queimada, sabe ao que me refiro: aquilo é descontrolado, mesmo quando se acha que acabou, uma fagulha pode recomeçar a queima.
Punição rigorosa aplicável inclusive e principalmente, em quem teria obrigação de prever a eventualidade e não o fez: os políticos. Onde há possibilidade de catástrofe natural, tem que haver monitoramento prévio, com uso de toda a tecnologia existente. Num país com a cobertura vegetal do Brasil, e área de parques naturais absurdamente insuficiente, o monitoramento dos incêndios deveria ser muito atento. E a punição, exemplar.
A gente aqui no Terceiro Mundo tinha uma idéia da Austrália como um país/continente bom, onde as coisas são bem feitas e as tragédias, antecipadamente previstas e neutralizadas. E no fim, nesse ano deram uma demonstração de terceiro-mundismo deplorável.
Do pouco que vi nos noticiários, ficaram-me duas imagens: uma, de um canguru em primeiro plano, fugindo de uma muralha de fogo ao fundo, muito próxima. Será que ele conseguiu achar abrigo e sobreviver?!
A outra, dá até uma esperancinha no ser humano: uma moça entra no incêndio, com risco da própria vida, para salvar um filhote de coala que, de outra maneira, morreria queimado. Essa pessoa deveria ter sido premiada pela coragem e pelo que mais falta a todos nós atualmente: humanidade.
Faltam cinquenta anos para o centenário do Dia da Terra, instituído em 1970. Será que o planeta chega até lá?!