Coluna esquinas
Por Coluna esquinas -
Céu de Agosto
Para Tânia, Oyama e Francisco, menino de alma leve
Na cidade inquieta e hostil, as pausas e silêncios nem sempre estão disponíveis. Há uma pressa nas faces, com seus problemas materiais e tensões capitalistas. Ali, entre pedras e metais, não há tempo para contemplar o céu e suas efêmeras metamorfoses.
Tenho aquela vontade de sentar em uma varanda voltada para o leste e observar os caminhos e paisagens que fogem de nós. Daquela vontade de sair, só para sentir a alegria de voltar. É...a cidade muda apressadamente e os prazeres do ócio vão sumindo e adoecendo toda gente.
As paisagens vão ficando menores com arranha-céus que sobem e deixam frestas de céu que acolhem quem olha. Brincar com nuvens fazendo desenhos está ficando raro.
Deitei na grama, no final de semana que passou, e fiquei contemplando o céu em um canto distante da cidade. O céu tem a capacidade de conduzir pensamentos para futuro, com planos e sonhos. Mas, principalmente, pela sensação de pequenez que temos diante daquilo tudo que vemos.
Uma amiga falou, no instante em que eu vivia esse voo pelos céus de Itajaí: o André vai fazer um conto ali, naquela tranquilidade. Não saiu um conto, mas fiquei, nos dias que seguiram, alimentando ideias sobre a relação humana com o céu, esse lugar etéreo que cristãos pensam ser nosso destino após a morte.
Talvez o sentimento de humildade diante dessa infinitude repleta de mistérios chegue trazendo tranquilidade ou nos colocando em xeque com nossas mesquinharias. Mas esse sentimento é, muitas vezes, acompanhado de um certo orgulho quando o pensamento vai para lugares nem sempre visitados por nós.
O que lhes conto bem que poderia ser um texto romântico bem ao estilo dos diários de uma adolescência que se foi, mas não. Penso nos tantos que olham tanto para o céu e não são solidários com as misérias humanas. Não posso deixar de lembrar daqueles que, sem casa, só tem o céu como teto. Ou pensar nas tantas vezes em que na história o céu foi abrigo para discursos etéreos de religiões sem fé.
No céu, fui remetido a um antigo poema que contou sobre meus medos:
Quando não existirem mais palavras, me apaixonarei pelas imagens.
Quando não existirem mais imagens, me contentarei com os silêncios.
Voarei com os deuses mais loucos até o céu de agosto e pousarei os sonhos ali.
Entre a terra e o céu está nosso lado mais humano. Que os sonhos habitem nosso agosto.
Fica a dica:
No filme Asas do Desejo (1987, direção: Wim Wenders) anjos assistem a miséria humana sem conseguir sentir suas dores e alegrias. Um dos anjos se apaixona por uma trapezista. A transição entre dois mundos: o divino e o profano estão ali. Um dilema que está entre nós todo dia.