Coluna Animal Humano
Por Coluna Animal Humano -
O que você já deixou de fazer por ser mulher?
Fui pega de surpresa ao ser convidada a gravar um vídeo sobre as dificuldades que passei ao longo da minha vida profissional por causa de atitudes machistas.
Primeiro me senti envergonhada e não consegui me concentrar para poder relembrar as supostas situações machistas as quais enfrentei. Depois respirei e pensei: essa é uma pergunta muito importante, então dane-se a vergonha, vou esquecer que existe uma câmera e vou focar na jornalista. Funcionou.
A vergonha foi embora e automaticamente um filme passou na minha cabeça. Muitos momentos importantes e de decisões que tive que tomar na minha vida profissional. E dei minha entrevista não sobre o que aconteceu, mas sim sobre como reagi, afinal era apenas um minuto de entrevista.
Ok, a mensagem foi dada, mas não consegui parar de pensar, depois, sobre tudo mais que poderia ter falado para de alguma maneira ajudar as ‘pessoas’ e não somente as mulheres.
Aqui, nessa coluna, tenho 2500 caracteres para poder resumir e compartilhar minha experiência através deste texto. Tenho 47 anos, então, venho de uma geração que conviveu com mulheres machistas. Para minha surpresa, as maiores dificuldades machistas que encontrei foram dentro da minha casa, por tentarem me proteger, mas principalmente pelo pensamento inaceitável de que a mulher “precisa de uma presença masculina para se sentir protegida e cuidada”.
Eu era uma adolescente e não entendia direito a dimensão do problema. Mas na época poucas adolescentes tinham o privilégio de trabalhar e estudar.
Eu já tinha um salário, o que significava uma pequena independência financeira, que colaborava com meus sonhos e projetos.
Abri meu primeiro negócio totalmente contra a vontade de parte da minha família. Mas meu padrastro se dispôs a ajudar. A proprietária da sala que loquei me fez uma oferta de “mãe para filha”. Desde muito cedo aprendi que escutar é válido, ponderar é válido, mas que quem toma as decisões na minha vida sou eu. E essa certeza é libertadora...
Por isso, me lembro pouco de me submeter a situações machistas. Eu colocava o limite, eu pude não permitir.
Me sinto muito privilegiada pela educação que recebi, pois tive a oportunidade de ser eu mesma. Mesmo quando minha familia tinha atitudes machistas, nunca foram violentos comigo. Eu não cresci com medo, mas ciente que preciso lutar pelas minhas escolhas.
Não fui espancada ou ameaçada. Sinto, profundamente, por crianças, meninas e meninos que não tiveram a mesma chance que eu tive de se transformarem em homens e mulheres seguros e livres.
Hoje tenho a certeza plena que vamos caminhar para um mundo melhor. Homens e mulheres estão chocados com o índice de feminicídios. Se você é uma dessas pessoas que ainda acha que existe uma diferença de capacidade entre um homem e uma mulher, por favor, procure ajuda. Existem psicanalistas maravilhosos que irão te mostrar que seus pais erraram na sua educação.
Busque ajude se você não consegue enxergar que, independente de gênero, somos humanos que dispomos de sonhos e de uma imensa capacidade de realização.
Mas todos precisamos de uma infância saudável, que proporcione oportunidades e segurança em busca da maturidade responsável e plena.